02/01/2005
(7º Domingo de Páscoa -A-, 12-Maio-2002)
O acontecimento
Esta solenidade foi transferida para o 7º domingo Páscoa desde seu dia
originário, a quinta-feira da 6º semana de Páscoa, quando se cumprem os quarenta
dias depois da ressurreição, conforme o relato de São Lucas em seu Evangelho e
nos Atos dos Apóstolos; mas continua conservando o simbolismo da quarentena:
como o Povo de Deus esteve quarenta dias em seu Êxodo do deserto até chegar à
terra prometida, assim Jesus cumpre seu Êxodo pascal em quarenta dias de
aparições e ensinamentos até ir ao Pai. A Ascensão é um momento mais do único
mistério pascal da morte e ressurreição de Jesus Cristo, e expressa sobretudo a
dimensão de exaltação e glorificação da natureza humana de Jesus como
contraponto à humilhação padecida na paixão, morte e sepultamento.
Ao contemplar a ascensão de seu Senhor à glória do Pai, os discípulos ficaram
assombrados, porque não entendiam as Escrituras antes do dom do Espírito, e
olhavam para o alto. Aparecem dois homens vestidos de branco, é uma teofania, a
mesma dos dois homens que Lucas descreve no sepulcro (24,4). Neles a Igreja Mãe
judaico-cristã via acertadamente a forma simbólica da divina presença do Pai,
que são Cristo e o Espírito. As palavras dos dois homens são fundamentais:
Galileus, o que fazeis aí plantados olhando para o céu? O próprio Jesus que vos
deixou para subir ao céu, voltará como vistes marchar (Atos 1,11). Em um excesso
de amor semelhante ao que o levou ao sacrifício, o Senhor voltará para tomar os
seus e para estar com eles para sempre; e se mostrará como imagem perfeita de
Deus, como ícone transformante por obra do Espírito, para nos tornar semelhantes
a ele, para contemplá-lo tal como ele é (1 João 3,1-12). Contemplando na
liturgia o ícone do Senhor – sobretudo na Eucaristia - intuamos o rosto de Deus
tal como é e como o veremos eternamente. E o invocamos para que venha agora e
sempre.
No relato deste mistério segundo o Evangelho de São Mateus (28,19-20), o Senhor
envia os discípulos a proclamar e realizar a salvação, segundo o triplo mistério
da Igreja: pastoral, litúrgico e magisterial: Ide e fazei discípulos de todos os
povos (pelo anúncio profético e o governo pastoral, formando e desenvolvendo a
vida da Igreja), batizando-se em nome do Pai, e do Filho e do Espírito Santo
(aplicando-lhes a salvação, introduzindo sacramentalmente na Igreja); e
ensinando-os a guardar tudo o que vos mandei (mediante o magistério apostólico e
a vida na caridade, o grande mandamento). O Plano de Deus está sendo cumprido, e
a salvação, anunciada primeiro a Israel, é proclamada a todos os povos. Nesta
obra de conversão universal, por longa e laboriosa que possa ser, o Ressuscitado
estará vivo e operante em meio dos seus: E sabei que eu estou convosco todos os
dias até o final dos tempos.
O mistério
A leitura apostólica que a Igreja propõe interpreta perfeitamente o
acontecimento da Ascensão do Senhor, adentrando-nos no mistério do ressuscitado
no santuário celeste. Agora podemos dizer com o canto do Santo que os céus e a
terra estão cheios da glória de Deus (Em Isaías 6,3 só se nomeava a terra).
Agora, com a ascensão da humanidade do Filho de Deus, comemorada no mistério
litúrgico, sobre a qual repousa a glória do Pai, adorada pelos anjos, também nós
somos unidos pela graça a este eterno louvor, no céu e na terra. Estamos no
penúltimo momento do mistério pascal, antes da doação do Espírito Santo ao se
completarem os cinqüenta dias, o Pentecostes.
A vida cristã
As orações desta solenidade pedem que permaneçamos fiéis à dupla condição da
vida cristã, orientada simultaneamente às realidades temporais e às eternas.
Esta é a vida na Igreja , comprometida na ação e constante na contemplação.
Porque Cristo, levantado no alto sobre a terra, atraiu para si todos os homens;
ressuscitando dentre os mortos enviou seu Espírito vivificador sobre seus
discípulos e por ele constituiu seu Corpo que é a Igreja, como sacramento
universal de salvação; estando sentado à direito do Pai, sem cessar atua no
mundo para conduzir os homens à sua Igreja e por Ela uni-los assim mais
estreitamente e, alimentando-os com seu próprio Corpo e Sangue, torná-los
partícipes de sua vida gloriosa. Instruídos pela fé sobre o sentido de nossa
vida temporal, ao mesmo tempo, com a esperança dos bens futuros, realizamos a
obra que o Padre nos confiou no mundo e lavramos nossa salvação (Vaticano II,
Lumen gentium 48).
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